A Fazenda traz a
cultura dos tempos do ouro e da cana-de-açúcar. Ela sustenta parte da história
da escravidão no brasil, e tem um imenso valor
histórico.
Hoje, restaurada e mantendo 80% de sua formação original, ela é alvo de visitas de moradores da região e de turistas.
A Fazenda Babilônia nasceu de um engenho de cana-de-açúcar, denominado São Joaquim, no século 18.
Em pouco tempo e com a ajuda do trabalho escravo, a Fazenda se tornou a maior empresa agrícola do Goiás no século 19.
Agora, tombada como Patrimônio Nacional, já tem mais de 200 anos de tradição. Antigamente, o local possuía cerca de 200 escravos, dentre eles, 120 homens trabalhadores e 80 mulheres e crianças.
Hoje, restaurada e mantendo 80% de sua formação original, ela é alvo de visitas de moradores da região e de turistas.
A Fazenda Babilônia nasceu de um engenho de cana-de-açúcar, denominado São Joaquim, no século 18.
Em pouco tempo e com a ajuda do trabalho escravo, a Fazenda se tornou a maior empresa agrícola do Goiás no século 19.
Agora, tombada como Patrimônio Nacional, já tem mais de 200 anos de tradição. Antigamente, o local possuía cerca de 200 escravos, dentre eles, 120 homens trabalhadores e 80 mulheres e crianças.
Construção
A arquitetura rígida da fazenda foi inteiramente construída pelos escravos.
Ela é sustentada por grossos esteios e vigas de madeira. Essas vigas, podem chegar a até dois palmos de grossura. Algumas partes da construção, foram construídas de adobe e pau-a-pique, que também resistiram até os dias de hoje.
A história
Em fins do Século XVIII, mas precisamente em 1795, chega em Meia Ponte o senhor Joaquim Alves de Oliveira. Homem culto, nascido em 1770, em Pilar de Goiás, educou-se junto aos padres jesuítas em São Paulo e desde moço mostrou excelentes dotes para o comércio, fazendo fortuna no Rio de Janeiro. Ao voltar para Goiás, vislumbrou progresso no até então fervilhante arraial de Meia Ponte, que vinha sofrendo franca decadência de suas minas do ouro.
Com a decadência da minas de ouro de Meia Ponte, o senhor Joaquim Alves de Oliveira iniciou a ousada empreeita de construir o Engenho São Joaquim,primitivo nome da Fazenda Babilônia, que segundo Pohl, em "Viagem ao Interior do Brasil", era "um dos maiores engenhos de acúcar do Brasil". logo após 1800, O Engenho São Joaquim já era considerada a maior empresa agrícola do Estado de Goiás. Nesta Fazenda, além da cana de açúcar, plantava-se, em escala industrial mandioca e algodão, para a produção da farinha e fios de algodão para exportação. A Inglaterra, em plena Revolução Industrial, comprava toda a produção de algodão goiano, cuja fibra era considerada uma das melhores do mundo. A produção desta fazenda era tão intensa que contava com cerca de 200 escravos, sendo 120 homens para o trabalho e 80 mulheres e crianças.
Um dos relatos mais significantes foi o do viajante frânces August Saint-Hilaire. Neste relato, vale destacar, entre tantas informações relevenates, a importância do Comendador Joaquim Alves para Goiás e Centro-Oeste, a ordem e o asseio da fazenda, as relações com os escravos, a produtividade e o comércio de bens, em especial o algodão para exportação. Saint-Hilaire ainda descreve com maestria a estrutura da fazenda, a maquina de ralar mandioca, movida a água, e a organização das senzalas e oficinas.
Devido ao seu grau de empreendedorismo, o Comendador pode ser comparado ao Barão de Mauá. Sua renda era muitas vezes superior à renda da província. Através da agricultura e do comércio conseguiu manter a então decadente Minas de Meia Ponte e transformá-la numa das principais cidades do estado. Por Meia Ponte passavam todas as "picadas de Goiás". Era o centro comercial de toda a província de Goiás. Meia Ponte era a confluência das rotas comercias, recebia e despachava tropas para Cuiabá, Salvador e Rio de Janeiro. A tropa do Comendador, de quase 300 muares, levava, além dos produtos da fazenda, como o algodão, açucar e farinha de mandioca, produtos diversos produzidos por outros fazendeiros da região, como o próprio algodão, que o Comendador incentivava e ajudava na produção e no comércio, e trazia nestas viagens produtos essenciais, como o sal e ferros, e outros tantos que lhe eram lucrativos, como tecidos finos e armas. Por ocasião da partida de sua comitiva, que era capitaneada por seu genro o Sargento-mor Joaquim da Costa Teixeira, iam também, por conforto e segurança, aqueles que desejavam viajar para fora da província, tornando a comitiva uma empreeitada solene, de longa duração e com muitos animais, carregamentos e muita gente. Para se ter idéia, gastava, em picadas pelo sertão, 3 meses de viagem para chegar a Salvador ou Rio de Janeiro, e no mínimo mais 3 meses para voltar.
Apesar de não ser o foco de nosso assunto, não há como não deixar de fazer um breve relato sobre a imponente figura do Comendador, que tinha a patente de Tenente-Coronel Comandante Joaquim Alves de Oliveira. Comandante liberal, patriota e humanitário, comprou uma tipografia, a Typographia Oliveira, e editou o primeiro jornal do Centro Oeste, a "Matutina Meiapontense" que circulou de 1830 a 1835, montou a primeira biblioteca de Goiás e trouxe professor para a educação da população. Foi dele a iniciativa de promover a agricultura na província goiana, num momento de decadência da mineração em toda a capitania de Goiás. Além de tudo era homem sábio e justo cuja efígie não deixou gravada, ninquém sabe ao certo como era o rosto deste homem.
Voltando a história da Fazenda babilônia, nela estiveram hospedados pessoas ilustres de referência para Goiás, como o próprio Saint-Hilaire, Pohl, Castelnau, D´alincourt, Cunha Mattos e outros. Porém sua decadência iniciou-se mesmo antes da morte do Comendador, desiludido pela perda da esposa e filhos, e pela desonra da filha num episódio lastimável, pouco a pouco foi se desinteressando pelos negócios e, em 1851, com avançados 81 anos, fez sua passagem para o mundo espiritual. Como não deixou herdeiros, apesar de ter tido três filhos, legou o Engenho São Joaquim, por testamento, ao seu braço-direito, seu genro e Sargento-mor Joaquim da Costa Teixeira.
Das construções e opulência da época do Comendador, muito se perdeu. Sem a presença do Comendador, o comércio decaiu e a fazenda diminuiu sua produção. Até que, em 1864, Joaquim da Costa Teixeira vendeu-a para o Padre Simeão Estelita Lopes Zedes, bisavô da atual proprietária, Dona Telma Lopes Machado.
Padre Simeão comprou, em 1864, parte da Fazenda, e encontrando lá, nesta ocasião, uma grande quantidade de agregados e escravos, achou que aquilo mais se assemelhava à Babilônia e desde então passou a chamar de Fazenda Babilônia. Em 1876, adquiriu mais uma parte da extensa fazenda, e atravessou o fim do século XIX e início do século XX como uma fazenda produtora de gado de corte.
Meia Ponte não resistiu as transformações do fim do século XIX, a morte do Comendador, a abolição da escravatura e a proclamação da república, fizeram com que as rotas comerciais fossem deslocadas, perdendo a então próspera cidade o status de centro mercantil, vindo a invadir o século XX com a economia estagnada, baseada principalmente no gado de corte.
O tempo cumpriu seu papel e desfez a senzala e oficinas, muros e estábulos, sobrando, por determinação da família, o belo casarão, sede da fazenda, com a casa, capela, varanda e o pátio do antigo engenho abrigados por um vasto telhado de duas águas de grandes telhas de barro. Devido a histórica importância a casa e suas dependências foram tombadas em 1965, inscritas no Livro de Belas Artes, nº 480 de 26/04/1965.
Com a construção de Brasília e o incremento do turismo em Pirenópolis, a Fazenda Babilônia tornou, gradativamente, local de visitação. Por iniciativa da atual proprietária, D. Telma, que nutre um incansável amor à história e às coisas de terra, em 1997 a fazenda foi aberta à visitação.
Hoje, a fazenda, além de trabalhar com pecuária, mantém o belo casarão, que preserva ainda cerca de 80% de sua originalidade. O casarão de grossas madeiras expostas, a capela, um pequeno museu de objetos antigos, sua história e o fabuloso e nutritivo café colonial, fazem da Fazenda babilônia a mais representativa fazenda histórica de Goiás, sendo objeto de estudos para teses de graduação e mestrado, pesquisas na área de arqueologia e história, destino de grupos de estudantes de todos os níveis, do médio ao superior, nas áreas de arquitetura, história, cultura e gastronomia.
Gastronomia
Um resgate antropológico da culinária goiana
O resgate que a Fazenda babilônia oferece não se resume somente ao patrimônio
e história, ao finais de semana e feriados na extensa mesa, acompanhada de uma
bela vista da fazenda, é servido uma fartíssíma refeição composta de mais de 40
itens, o Café Colonial da Fazenda Babilônia. Feito com produtos da própria
fazenda, o café resgata receitas antigas, típicas de um Goiás rural e antigo.
Não só alimenta como instrui. Veja só o que te espera:
Carnes
Almôndegas
- Ingredientes: Carne da vaca, toucinho de porco moído.
Guardada na própria gordura em que foi frita. Sistema de conservar carnes
fora da geladeira.
- Carne da Porco
- Ingredientes: Carne de porco caipira, açafrão, alho, pimenta bode.
Carne guardada na banha. Sistema de conservar carnes fora da geladeira.
Carne de Rendenho à Moda da Casa
- Ingredientes: Carne de vaca moída, carne de porco moída, açafrão, pimenta bode, manjericão e rendenho.
Carne envolvida em rendenho e assada.
Linguiça
- Prato típico.
Ingredientes: Carne de porco caipira, açafrão, alfavaca, pimenta bode, alho e sal.
- Assada no borralho. Espécie de comida muito usada pelos tropeiros por sua durabilidade.
Ingredientes: Carne de galinha caipira moída, toucinho moído, açafrão, mpimenta bode, ovos, farinha de milho caseira.
Matula de Galinha
Paçoca de Carne Seca
- Todos os ingredientes socados no pilão. por ser um alimento durável, é preferido pelos tropeiros em suas longas viagens.
Ingredientes: Carne seca frita, açafrão, pimenta bode, farinha de mandioca.
Queijos:
Requeijão
- Queijo típico goiano feito no tacho de cobre.
Ingredientes: Coalhada azeda, creme da própria coalhada e sal.
- Ingredientes: Queijo feito do soro do queijo mineiro, vinagre branco, azeitona, cebolinha e salsa.
Ricota Temperada
Queijo Frescal
- Queijo tipo mineiro.
Quitandas
- Biscoito tradicional, muito usado em Minas e Goiás.
Ingredientes: Polvilho, óleo, açúcar e ovos.
Biscoito Doce (Quebrador)
Biscoito de Queijo
- Biscoito tradicional em Minas e Goiás.
Ingredientes: Polvilho, queijo ralado, ovos, banha de porco.
Bolo de Fubá de Arroz
- O fermento é natural, amassado de véspera para fermentação. Assado logo a seguir. Típico da regiõs de Minas e Goiás.
Ingredientes: Arroz socado no pilão, ovos, açúcar, queijo ralado, manteiga e erva doce.
Pamonha Frita
- Comida usada na cultura indígena, sofrendo modificações nos dias de hoje.
Ingredientes: milho verde ralado e sal.
Pão Caseiro
- Variedade de pão caseiro muito usado na região.
Ingredientes: Trigo, ovos, leite e sal.
Pão de Alho
- Variedade de pão caseiro muito usado na região.
Ingredientes: Trigo, ovos, leite, sal, cebola, alho e fermento.
Pão de Mandioca
- Variedade de pão caseiro muito usado na região. Substituia o pão de trigo na época da colonização.
Ingredientes: mandioca cozida, ovos, leite, açúcar, óleo e sal.
Pão de Queijo
- Uma variedade do biscoito de queijo, sendo modificado de acordo com cada região.
Ingredientes
Pau-a-pique
- Comida típica indígena, uma variação do beiju, sofrendo algumas variações com o tempo. Assado na folha de bananeira, muito usado na época do Brasil Colônia.
Ingredientes: Massa de mandioca seca, queijo ralado, coco ralado, leite de coco, ovos, manteiga de leite.
Rosca Caseira
- Uma das variedades de rosca caseira usada na região
Ingredientes: Farinha de trigo, óleo, leite e ovos.
- Variedade de biscoito assado na folha de bananeira, usado no interior de Minas e Goiás.
Ingredientes
Cavaco de Queijo
Brôa de Fubá
- Uma das variedade de quitandas a base de fubá de milho, muito consumida pelos negros.
Ingredientes: Fubá de canjica, ovos, leite e óleo.
Brevidades
- Receita típica da região de Minas e Goiás, sendo muito usada na época do Brasil Colônia.
Ingredientes: Polvilho, ovos e açúcar.
Mané Pelado
- Variedade de receita criada pelas mulheres portuguesas baseadas na culinária indígena. Muito usada na época do Brasil Central.
Ingredientes: Massa de mandioca ralada, ovos, queijo, leite de coco.
Bolo da Senzala
- Bolo assado na folha de bananeira. Receita muito usada pelos escravos na senzala.
Ingredientes: Fubá de canjica, leite, cravo, canela, açúcar e garapa.
Bolo da Sinhá
- Bolos produzidos pelas negras para suas senhoras nos engenhos de cana.
Ingredientes: Coalhada azeda, fubá de milho, abóbora madura.
- Uma das variedades das receitas de milho verde.
Ingredientes: Milho verde ralado, ovos, açúcar, manteiga de leite.
Pamonha Assada
Virado de Raspa
- Cozido e assado na folha de bananeira.
Ingredientes: Raspa de mandioca, carne seca, torresmo.
Melado de Cana
E tudo isso regado a suco de frutas da época e típicas da região, caldo de
cana, leite e café.
Caso você queira visitar a
Fazenda ela fica aberta para visitas aos sábados, domingos e feriados. Das
9:00 às 16:00 h. Para visitas no meio da semana, apenas com
agendamento.
Café colonial,
na rústica mesa de madeira presente na fazenda.Uma Fazenda Modelo
Capítulo sobre a Fazenda Babilônia. Parte do relato histórico feito por
August Saint-Hilaire.
"A 5 léguas de Gonçalo Marques parei na fazenda do comandante de Meia-Ponte,
Joaquim Alves de Oliveira, para quem o governador da província me tinha dado uma
carta de recomendação, tendo nessa ocasião feito grandes elogios a ele. A
acolhida que me deu foi perfeita, e passei alguns dias em sua propriedade.
Joaquim Alves de Oliveira amealhara à custa do próprio esforço a sua fortuna,
que era considerável. Tinha sido educado por um jesuíta, e parece que absorvera
nessa escola o espírito metódico e equilibrado que o fazia sobressair entre os
seus compatriotas. A princípio dedicou-se ao comércio, mas como tinha mais
pendor para a agricultura, acabou por renunciar quase que inteiramente aos seus
interesses mercantis. Não obstante, entregava-se ainda a transações comerciais
quando esperava poder obter um lucro razoável. Assim, por ocasião de minha
passagem por ali ele tinha acabado de enviar o genro a Cuiabá com uma numerosa
tropa carregada de mercadorias variadas. Tinha, porém, o hábito de jamais falar
com quem quer que fosse sobre os seus negócios, e ninguém ficava sabendo quando
ele ganhava ou perdia dinheiro nas suas transações. Entre os brasileiros que
conheci, era ele, talvez, o que tinha mais aversão à ociosidade. "Concedo a meus
hóspedes", dizia-me ele sorrindo, "três dias de descanso. Ao cabo desse tempo,
porém, descarrego sobre eles uma parte dos serviços da casa". As conversas de
Joaquim Alves revelavam que ele era dotado de um grande amor à justiça e de uma
religião sem mesquinhez. Era homem de muito senso, de uma grande simplicidade e
de uma bondade extrema.
A fazenda, fundada por ele, nunca tivera outro nome a não ser o seu.
Tratava-se, inegavelmente, da mais bela propriedade que havia em toda a região
de Goiás que eu tinha percorrido. Reinavam ali uma limpeza e uma ordem que eu
ainda não vira em nenhuma outra parte. A casa da fazenda era ao rés do chão e
nada tinha de extraordinária, mas era ampla e muito bem conservada. Na frente,
uma extensa varanda oferecia sombra e ar fresco em todas as horas do dia. O
engenho-de-açúcar, conjugado à casa, fora construído de maneira que, da sala de
jantar, pudesse ser visto o trabalho que se fazia junto às caldeiras, e da
varanda, o que se passava no moinho de cana. Este último dava para um pátio
quadrado. O corpo da casa se prolongava numa série de construções, que formavam
um dos lados do pátio, nas quais estavam instaladas a selaria, as oficinas do
serralheiro, do sapateiro, a sala dos arreios e, finalmente, a cocheira. Outro
lado era construído pelos alojamentos dos escravos casados. Esses alojamentos
eram cobertos de telhas e divididos em cubículos por paredes até certa altura.
Um muro de adobe fechava os dois lados restantes do pátio.
A casa fora organizada desde o princípio com tamanha perfeição que o seu
proprietário já não tinha, por assim dizer, necessidade de dar nenhuma ordem.
Cada um sabia o que tinha de fazer e tratava de se colocar no seu posto de
trabalho por sua própria conta. Para se fazer entender, bastava ao dono, se
quisesse, dizer apenas uma palavra ou fazer um simples gesto. No meio de uma
centena de escravos não se ouviam ordens gritadas nem se viam homens apressados
andando de um lado para o outro, apenas aparentando grande atividade, mas na
verdade sem saberem o que fazer. Em toda parte reinavam o silêncio, a ordem e
uma tranqüilidade que se harmonizava perfeitamente com a que a Natureza costuma
oferecer naqueles climas amenos. Dir-se-ia que um gênio invisível governava a
casa. Seu proprietário ficava sentado tranqüilamente na varanda, mas era fácil
ver que nada lhe escapava e que bastava um rápido olhar para manter tudo sob
controle
As regras estabelecidas por Joaquim Alves quanto ao tratamento dado aos
escravos consistiam em mantê-los bem alimentados e vestidos decentemente, em
cuidar deles adequadamente quando adoeciam e em jamais deixá-los ociosos. Todo
ano ele provia o casamento de alguns, e as mães só iam trabalhar nas plantações
quando os filhos já podiam dispensar os seus cuidados. As crianças eram então
confiadas a uma só mulher, que zelava por todas. Uma sábia precaução fora tomada
para evitar, tanto quanto possível, as ciumadas e as brigas: os quartos dos
solteiros ficavam situados a uma boa distância dos alojamentos dos casados.
O domingo pertencia aos escravos. Eles não tinham permissão para ir procurar
ouro, mas recebiam um pedaço de terra que podiam cultivar em seu próprio
proveito. Joaquim Alves instalara em sua própria casa uma venda onde os negros
podiam comprar as coisas que geralmente são do agrado dos africanos. Nas suas
transações o algodão fazia o papel do dinheiro. Dessa maneira ele livrava os
escravos da tentação do roubo, estimulava-os ao trabalho acenando-lhes com os
lucros de suas lavouras, fazia com que se apegassem ao lugar e ao seu senhor, ao
mesmo tempo que aumentava a produção de suas terras.
Durante minha permanência na casa do comandante de Meia-Ponte visitei as
várias dependências de sua fazenda, o chiqueiro, o paiol, o moinho de farinha, o
local onde era ralada a mandioca e onde ficava instalada a máquina de descaroçar
o algodão, a fábrica de fiação, etc. etc., e em toda parte encontrei uma ordem e
uma limpeza incomparáveis. Os fornos do engenho-de-açúcar não tinham sido feitos
de acordo com as especificações da técnica moderna. Seu aquecimento era feito
pelo lado de fora, o que pelo menos tornava menos penosa para os trabalhadores a
operação de cozimento. Um tambor horizontal movido a água punha em movimento
doze peguenas máguinas de descaroçar algodão. Era também a água a máquina de
ralar mandioca, da qual darei aqui uma descrição. A casa onde se achava
instalada era construída sobre estacas e embaixo do assoalho fora colocada uma
roda em posição horizontal, que era movida pela água que caía de uma calha em
plano inclinado. O eixo da roda atravessava o assoalho e se elevava até certa
altura, tendo na extremidade outra roda horizontal cujo aro era revestido por um
ralo de metal. O eixo e a roda superior ficavam encaixados dentro de um quadrado
formado por quatro estacas,cada uma das quais tinha uma chanfradura na parte
interna, ao nível do ralo. Quando a roda começava a girar, quatro pessoas
seguravam as mandiocas, encaixando-as nas chanfraduras. Tendo esse ponto de
apoio, seus braços podiam manter-se firmes e a ação da máquina não sofria
interrupção.
Numa parte de suas terras o comandante de Meia-Ponte tinha deixado de lado o
método primitivo adotado geralmente pelos brasileiros em suas lavouras. Passara
a usar o arado e adubava a terra com o bagaço da cana. Dessa forma não havia
necessidade de queimar novas matas todo ano. A cana era replantada sempre no
mesmo terreno, que ficava situado perto da casa para facilitar a supervisão do
dono e poupar tempo aos escravos. O açúcar e a cachaça eram vendidos em
Meia-Ponte e Vila Boa, mas o algodão era exportado para o Rio de Janeiro e
Bahia. Joaquim Alves foi o primeiro, como já disse, a demonstrar a vantagem
dessas exportações, e seu exemplo foi seguido por vários outros colonos. Por
ocasião de minha viagem ele estava planejando aumentar ainda mais suas
plantações de algodão e tinha intenção de instalar no próprio arraial de
Meia-Ponte uma descaroçadora, bem como uma fiação onde pretendia empregar as
mulheres e as crianças sem trabalho. Depois de descaroçado, o algodão da região,
cuja qualidade é excelente, era vendido no local a 3.000 réis a arroba. O
transporte de Meia-Ponte à Bahia custava 1.800 réis a arroba, e até o Rio de
Janeiro 2.000. O lucro obtido com as exportações a esse preço era tão garantido
que Joaquim Alves não vacilara em se oferecer para comprar, à razão der 3.000
réis, o algodão produzido por todos os agricultores das redondezas.
Ao dedicar sua atenção a um produto que podia ser exportado com proveito, o
comandante de Meia-Ponte incentivava seus compatriotas a tomar novos rumos,
indicando-lhes o que devia ser feito para arrancar sua região do estado de
penúria em que a mergulhara uma exportação do ouro mal orientada. Enquanto ele
agia de maneira prática, vários de seus concidadãos afirmavam que só havia
salvação para a província numa idéia absurda apresentada por Luís Antônio da
Silva e Souza. Segundo eles, a única maneira de deter a decadência sempre
crescente da província seria impedir a saída do ouro para fora de suas
fronteiras, criando-se para isso uma moeda provincial. Poder-se-ia argumentar,
entretanto, que se essa moeda não tivesse valor como metal não haveria força
humana capaz de lhe dar algum crédito. Se, pelo contrário, ela fosse de cobre,
de ouro ou de prata, acabaria saindo da província de uma forma ou outra, por
mais rigorosa que fosse a proibição, como acontecem todos os dias com o ouro em
pó. Uma vez fora de suas fronteiras, porém, ela só seria aceita pelo seu valor
intrínseco, e em conseqüência os comerciantes de Goiás passarão a vender suas
mercadorias por um preço que compense a sua desvalorização. O ouro adulterado
que circula em Goiás já pode ser considerado uma espécie de moeda provincial,
pois só é aceito ali, e quando o comerciante o remete para fora ele se vê
obrigado a reduzi-lo ao seu valor real, purificando-o, para em seguida reajustar
os seus preços de acordo com a redução de peso sofrida pelo ouro.
Depois de tantas jornadas tediosas e cansativas através dos sertões, senti-me
feliz por me achar numa casa que reunia todo o conforto que a região podia
oferecer, onde eu gozava de inteira liberdade e cujo proprietário, um homem
esclarecido, tinha por mim toda consideração. O tempo que passei na casa de
Joaquim Alves foi muito proveitoso. Meus homens fizeram uma esplêndida caçada
nas margens de uma lagoa situada nas proximidades. Quanto a mim, passei para o
papel uma parte dos dados que recolhera sobre vários assuntos e obtive novas
informações em conversas com meu hospedeiro.
Deixei a fazenda cheio de gratidão pela excelente acolhida que me deu o seu
proprietário e me dirigi a Meia-Ponte, distante dali uma légua."
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Fonte:http://www.fazendababilonia.tur.br
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